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sábado, 24 de maio de 2014

Rap di protesto

"Obrigado, bemvindos, é um prazer estar aqui", diz Hezbó MC quando abre um concerto. Transmite uma responsabilidade e humildade por ser um mestre de cerimónia, MC.

Fight pa txiga freedom é o título do seu último albúm. Tem como conteúdo critica social: os problemas sociais que de uma maneira ou outra nos afecta a todos como cidadãos. Hezbó MC fala dos subúrbios, da crise, dos imigrantes, dos assassínios pela mão da polícia, da dificuldade da comunidade africana, das discriminações e de outras experiências passadas pelo próprio.


Para além de um MC, também é um activista, e sente a responsabilidade para com o povo. "Eu falo [...] não só dos cabo-verdianos ou dos africanos mas também dos brancos pobres nos bairros, das pessoas que encaram com esses problemas", ele diz numa entrevista.

Hezbó MC tem traçado muitas lutas. Uma delas é a necessidade à utilização da língua crioulo, a sua língua mãe. Uma língua, que foi, e ainda é, muito criticada. Eu ainda me lembro de ser gozado por falar crioulo. Uns até chamavam de pretoguês porque não sabiam que crioulo é uma língua. "Falo na língua que sinto mais natural. [...] Eu também tenho esse direito", afirma Hezbó MC.


Em Portugal, os média tem por costume o hábito de consumir músicas em inglês. Só há algum tempo para cá que abriram mais espaço para outras músicas do mundo e nacionais. A questão da língua é muito importante. O escritor queniano Ngugi wa Thiong'o defende que "[l]anguage carries culture, culture carries [...] the entire values by which we came to perceive ourselves and our place in the world" no seu livro Decolonizing the Mind.

De mic na mão como seu canhão está a fazer uma excursão por todo o país. Promovendo o hip-hop e abrindo portas, uma vez fechadas. "Aquela mensagem, aquele sentimento que passo na minha música é importante."

domingo, 2 de março de 2014

Uma tarde no Coqueiro

O sábado levou-me até ao Coqueiro. É o café que nesses dias nunca falha música tradicional caboverdiana ao vivo. Sabia que o lugar proporcionaria uma boa tarde. "Dan kel café ku kel ponche, mano", disse ao meu amigo no outro lado do balcão. Os artistas tocavam com os seus instrumentos produzindo um som melódico. Éramos poucas pessoas naquela altura mas assim que o ritmo aqueceu, a música tornou-se num cheiro aromático atraente que de certeza viajou longe.

Mais pessoas e artistas apareceram. De repente esses mesmos artistas subiam ao palco sem problemas, como membros de uma grande família que aí estava, e cantavam uma ou duas músicas. O espaço ficou ainda mais animado e parecia que todos conheciam-se uns aos outros. A música mais uma vez fez maravilhas e juntou uma comunidade. Os pastéis de peixe e os torresmos saíram da cozinha. E como cheiro bom dá fome, foram muito populares.

Sai cá fora para arejar um bocado e falar com alguns amigos no pátio, quando uma carrinha da polícia aproximava lentamente. A primeira pensei que estavam a fazer uma simples rotina ao meio da tarde. Mas obviamente que não, nunca existiu uma simples rotina na Cova da Moura. Que tolice a minha. A carrinha estava cheia de polícias equipados com armas de fogo com a intenção de as mostrar a todos. Até consegui imaginar o resto que não era possível ver. Nesta prática passaram duas, passaram três vezes. Cada uma delas com gestos notórios de intimidação. Um caqueirada na cabeça, como dizemos em crioulo. Significa pancada na cabeça para aprender. 

Acabei por entrar no café para assistir mais um pouco da música. O guitarrista que decidiu animar mais com um show off a Jimi Hendrix até tocava com os dentes. Algumas pessoas dançavam enquanto outras observavam os músicos, como entendedores da arte.

No regresso vi crianças a brincar na estrada. Umas estavam a saltar a corda, outras a cantar. Depois surgiu um puto a correr por de traz de mim. "Pow, pow, pow!", gritou apontando uma arma imaginária. Recapitulei o que se passou naquele dia com a carrinha de polícias.

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

O grande concerto improvável

Na passada 6º feira ao cair da noite já se sentia o frio, o vento fazia barulho e as nuvens estavam gordas e carregadas a cinzento escuro. Cheirava-me a um grande temporal. A minha vontade de ir assistir um concerto no Bartô já estava a desaparecer. Mas a curiosidade ganhou: o flyer informava que seriam LBC, Hezbó MC e AYE-AYE num concerto improvável. Este último grupo, ao contrário dos outros dois artistas que são rappers da Cova da Moura, não conhecia mas sabia que era de estilo punk.

Caminhei nas ruas estreitas e grafitadas de Lisboa com a sorte de ainda não estar a chover. Finalmente, depois de muitas subidas e escadas senti-me a chegar ao pico. O Chapitô parece uma pequena aldeia de madeira com árvores, plantas, mesas com velas e uma iluminação suave. Desci umas escadas ao bar Bartô e avistei LBC e Hezbó MC ainda cá fora. Foi um descanso ao saber que ainda não tinham começado. Ainda deu para conversar um pouco.

Lá dentro sentia-se uma vibração positiva pelo ar. Assim que peguei na minha cerveja, a batida começou a entrar. Hezbó MC com o LBC começaram a rimar em crioulo. No mic rolavam palavras como "fight pa tchiga freedom". Conhecia algumas músicas e quando dava por mim já estava a cantar. Outros convidados apareceram com MOV-I que adoçou mais o ambiente. Quando pensei que já estavam a fechar a sessão chegou a grande surpresa: uma mistura com os AYE-AYE, o grupo punk. O improvável, mas possível encontro. A recepção foi forte e o improviso foi à altura. A música deixou-nos com um sabor na boca, a pedir que continuassem.

Os artistas foram abordados com cumprimentos ao sair do palco, até que os perdi de vista. Fiquei muito contente por ter experienciado uma ocasião de estilos diferentes, mas juntos numa música de protesto. O caminhar para casa foi feita com grande alegria e sem preocupações climáticas.