segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Tenho um sonho

Ao entrar na Cova da Moura o retrato de Martin Luther King chama-me logo à atenção. Uma figura possante e marcante. Vários sentimentos ocorrem na minha cabeça e espalham pelo meu corpo. Penso no seu poder de liderança, no código de não-violência que apoiava, na persistência que tinha e nas maneiras que fazia protestos numa época muito racista. 

“I have a dream” foi a parte do discurso de Martin Luther King que gerou um sol radiante de esperança e alimentou as aspirações de milhares de pessoas nos Estados Unidos da América. Foi um discurso que veio ajudar a uma mudança política a favor de melhores condições para os negros. Imagino os olhos regalados, os ouvidos afinados e as emoções de todos aqueles que o assistiram.

Nesse mês de Agosto faz 50 anos desde que foi feito o discurso “I have a dream”. É importante relembrá-lo e continuar a passar a sua legacia para que fique presente na memória do povo. O sonho de Martin Luther King é de uma sociedade de igualdade, livre, justa e de irmandade. Todos nós herdámos a responsabilidade para continuar o seu trabalho.

Na Zona o retrato de Martin Luther King transmite uma mensagem dupla. Representa esperança mas ao mesmo tempo alerta que continua a haver pessoas que sofrem de injustiça e de discriminação. As pinturas dos Smurfs que agora o rodeiam desviam e menorizam o que ele realmente representa.

A luta continua…

domingo, 18 de agosto de 2013

O puto

Me lembro que gostava muito de jogar a bola com os mais velhos lá da minha rua. Isso fazia-me sentir valorizado. O campo era a estrada, logo à frente das nossas casas. Os veículos circulavam com velocidade, quer de baixo ou de cima. Mas a malta assim que ouvia o barulho de um motor, parava logo o jogo. Parecia natural sentir a vir o perigo.

Estar com as mãos no chão era normal e sabia bem. Ora era jogar ao pião, à malha ou ao berlinde. Este último era um dos meus preferidos. Toda a rapaziada da zona desafiava -se entre eles. Os mais graúdos tentavam sempre jogar com os mais novos para acumular o máximo de berlindes e juntar à colecção. Eu fazia de tudo para não enfrentá-los mas às vezes era impossível escapar aos desafios e as apostas.


















Os carros era uma paixão minha, quase todos que passavam a rasgar na estrada gritava eu "Kel la é di meu".  Isso ajudou para criação de carros de caixas de fruta e madeira. Para mim eram ocasiões especiais. Sentia uma adrenalina enorme ao descer pela rua abaixo no meu carro. Por vezes fazíamos corridas com um final sem troféu mas com um sorriso gigantesco. As derrapagens e as curvas que levantavam poeira era uma maneira de exibir e mostrar controlo total do veículo. Às vezes lá surgia o descontrolo e as tombas. Tinha outros amigos que construíam viaturas de arame e lata que também era cool, e artístico.

Outras coisas que fazia era correr para todo o lado com aros de bicicleta ou pneus encontrados no lixo. Para mim era uma simulação de uma mota, na minha cabeça imaginária. Os para-choques dos carros abatidos que encontrava eram a minha canoa para deslizar numa descida de terra qualquer. Naquela época ser criativo era importante porque brinquedos não tinham. Ali tudo se transformava.

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Verdadeiro ou falso?

Falso foi o que pensei quando vi pela primeira vez a foto de uma parte da Cova da Moura pintada toda de azul com figuras do filme Os Smurfs. Que brincadeira de mau gosto, pensei. Pareceu um lugar de um outro planeta.

Pouco tempo depois a imagem veio revelar-se verdade. Fiquei chocado e confuso. E ainda por cima é uma publicidade de um filme que está nos cinemas. Será que ficou bonito? Tem graça? Terá alguma vantagem? Que benefícios traz? O facto é que nada encontrei de benéfico naquilo tudo. Muito pelo contrário.




















O bairro é um lugar com vários problemas. Uma delas é a manutenção das habitações. Há várias famílias que não conseguem manter a casa em condições, mesmo se quisessem. Será que os que tiveram a ideia da pintura aproveitaram dessa situação? E será que os habitantes aceitaram a ideia por causa disto? Porque entre pintar e não pintar obviamente a maioria escolheria o pintar. Eu não conheço os detalhes por detrás disso. Mas a realidade é, se fosse um bairro mais rico os habitantes de certeza não deixariam isso acontecer.

O que irá acontecer quando o hype acabar? Será que as casas vão ser repintadas?

E o estrago que foi feito à pintura de Martin Luther King. Que cena, que insulto. Meterias um calendário pornográfico por trás de um crucifixo? Obviamente que não. Nada ficou a condizer. O King é sinonimo de assunto sério, não de brincadeira.
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Por último, não gostava que a Cova da Moura viesse a ser identificada com a aldeia dos Smurfs. Já levámos com tanto preconceito, tantos estereótipos e piadas estúpidas.

domingo, 11 de agosto de 2013

Um lugar que chamamos de casa

Quando falo de casa, falo de um lugar de descanso. É como um barco atracado no cais depois de muitas agitações no alto mar. Ou o peito da Mamã aonde o bebé adormece depois de amamentar. Um lugar tranquilo e seguro. A minha zona, Cova da Moura, é esse lugar para mim.

Todos nós emigrantes ou imigrantes temos as nossas razões de sair do lugar aonde nós gostamos. Mas é sempre bom regressar as origens e se sentir em casa. Ouvir o funaná do vizinho, comer um gelado caseiro de Dona Noti, sentar com os amigos no Largo da Bola ou na Rua Principal e vaguear nos becos.


















Eu tenho a sorte de ter um lugar aonde voltar. Mas nem todos têm esse privilégio. Muitos bairros foram destruídos e os moradores foram realojados para outras áreas desconhecidas. A uns nem casa deram para orientarem á vida. Perderam o seu pedaço de terra, se assim posso dizer.

Nem imagino os vazios que sentiram e a desorientação que tiveram. Comunidades foram dispersas. Distanciaram famílias, amigos e vizinhos. Não foi só uma perda de morada, mas também de identidade.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Nha Zona

Tantas vezes penso no lugar aonde eu nasci. Na zona aonde cresci. No lugar aonde chamamos de casa. Nos colegas, no pai, na mãe, nas tias, nos tios, na irmandade na minha comunidade, nos bons e maus momentos. Acima de tudo é o lugar que eu adoro. Aonde a minha memória sempre volta.


Este blog é uma forma de partilhar convosco lembranças, experiências, noticias, músicas, histórias e outros assuntos das zonas. Compartilhar tudo isso é uma forma de manter perto de mim o que mais sinto falta. Para que "Nha Zona" seja um link para todos aqueles que vivem dentro ou fora da zona.